terça-feira, 13 de março de 2012

A Serragem da Velha

A quadra da Quaresma sempre foi, para o povo de certos locais do Minho, época de arreigadas tradições e profunda religiosidade. Temente a Deus, o povo encarava o tempo de preparação para a Páscoa com o maior respeito. Era tempo de luto e de silêncio. Até a carne era banida das suas refeições. A partir de Terça-Feira Gorda até Sexta-Feira Santa estavam «proibidas» as cantorias e outras manifestações de alegria, todavia, precisamente a meio da Quaresma, mandava a tradição que as restrições impostas fossem esquecidas por um dia: o dia da Serragem da Velha. Tratava-se de uma brincadeira humorística, satírica e crítica, que tinha a intenção de apontar os defeitos ou as virtudes de pessoas socialmente conhecidas. A representação acontecia numa quarta feira, precisamente a meio da Quaresma, no monte mais alto das freguesias, e era feita num cenário que fazia lembrar um misto de tribunal e cartório notarial, consistindo na leitura de um hipotético testamento feito por um velha moribunda que deixava os seus bens aos familiares e amigos. O “Tabelião da Comarca” iniciava o ritual lendo em voz alta os preceitos legais que fundamentavam a abertura do “testamento”. Imediatamente a seguir, “Tabelião e Relator” davam a conhecer o veredicto do testamento por entre sons ruidosos emanados de búzios, cornos de boi, funis… que os “parentes” mais próximos da moribunda se encarregavam de emitir. As suas vozes, ampliadas por acção de um funil em chapa, aqui deixo um exemplo do que se fazia, e recentemente tomei conhecimento  esses rituais voltam em certas terras a ser realizados,  eis um exemplo das sentenças  :

Oh velha,
Que deixas ao Manuel Moreira?
A porca de sete mamas
E a cadela parideira.

Deixo-lhe ainda uma vaca,
Com um toiro na desmama,
E o penico bem cheio,
“P’ra” pôr em cima da cama.

Oh velha,
Que deixas ao Quim Padeiro?
Uma galinha pelada
E um pau de marmeleiro.

Deixo-lhe a pia dos porcos
E a casota do cão,
A corte da burra velha
E o boi da cobrição…

Os bens considerados menos valiosos eram distribuídos em favor das raparigas das freguesias, estendendo-se, geralmente, também aos seus namorados. O “Tabelião e Relator”, cientes da importância da sua função, continuavam:

Oh velha,
A quem deixas o presunto?
Ao Luís e à Joaquina
Que são dois barrigas d’unto.

Oh velha,
A quem deixas tu a horta?
À Maria do Armindo
Que tem cara de cú “p’rá” porta.

Aos rapazes mais jovens só lhes era permitido tomar parte na Serragem da Velha se demonstrassem perante os mais velhos já terem pelos genitais

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