Há uma certa ilusão que vem do Estado Novo, muito pela
divisão regionalista, de que há características que diferem de uma aldeia para
a outra. Recordo que as pessoas sempre tiveram migrações de trabalho na época
do tempo da ditadura e levavam as músicas de um lado para o outro. Mas é
verdade que há registos que, sabemos, são característicos de determinadas
regiões: sabemos que temos gaitas galegas no Minho, gaitas mirandesas em
Trás-os-Montes, os adufes na Beira Baixa, as violas de campaniças no Alentejo e
amarantinas no Alto Douro, as braguesas no Minho, as violas da terra nos Açores
ou as violas de arame na Madeira. Contudo, a riqueza é imensa porque o país
também tem esta grande multiculturalidade e tão rico nestas tradições.
É importante que as pessoas e fundamental que não se
esqueçam da tradição, do património imaterial e de todas as memórias
relacionadas com a tradição oral portuguesa. Começo por dizer que, por exemplo,
quando vamos ver o «Povo que Canta», de Michel Giacometti, filmado nos anos de
1970, vemos pessoas novas a cantar, mas hoje ainda há uma certa camada da
população que tem a noção que só os velhos que é cantam esses cantares e que ainda
mantém estas tradições, mas não é verdade porque podemos comprovar que cada vez
mais os jovens estão presentes quer em grupos ou em ranchos de folclore e é ai
como toda a gente sabe que esses grupos são os fiéis representantes desses
tempos ancestrais
Se o património material está a cair, o imaterial está pior
ainda, tem sido muito maltratado. Portugal não tem auto-estima e não é só na
música. A música portuguesa não gosta dela própria, tal como a cultura não
gosta dela própria, certas pessoas não vêem essas riquezas. Continuamos sem um
programa de televisão, por exemplo, que fale sobre as nossas tradições e as
memórias musicais. Isto, de certa forma, tem a ver com um certo preconceito
rural que ainda existe em Portugal.
As pessoas acham que tudo o que vem do
mundo rural é sinónimo de ultrapassado. E isso é triste. É fundamental mostrar
estas riquezas porque um dia vão morrer sem a maioria da população as conhecer.
Já basta a crise económica, não podemos alimentar mais uma crise identidária
que, como sabemos, não é de agora. As pessoas acham que tudo o que vem do mundo
rural é sinónimo de ultrapassado.
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